sábado, 21 de julho de 2007

SUINGUEIRA, ARROCHA E OUTROS PALAVRÕES...


A evolução histórica, filosófica e sexual da música baiana poderia ser facilmente explicada através do corpo humano. Se você tem mais de 30 anos e puxar um pouco pela memória, com certeza vai se lembrar que na primeira fase da era paleolítica do axé, a coisa brotava mais do coração. Era um tal de "eu amo Salvador, a Bahia é linda, tudo é lindo, salve o Pelourinho, Dodô e Osmar" etc. Parecia jingle da secretaria de turismo da capital baiana. Depois a coisa ficou mais didática e intelectual, menos melosa e subiu pra cabeça. Só se ouvia falar (e cantar) em Olodum, Egito, Madagascar, enfim, de uma hora pra outra, figuras como Faraó, Osíris, Íris e Salassiê (o rei que gostava de reaggue) ficaram tão conhecidas quanto os participantes do Big Brother Brasil.
Fora isso tudo, ainda houve aquela fase em que a vogal teve importância fundamental no dialeto da moderna filosofia musical baiana. Era obrigatório que toda música tivesse um aê, aê, aê no começo, seguido de um iô, iô, iô no meio pra terminar com iá, iá, iá no final. E havia gente que ainda tinha dificuldade de decorar a letra.
Foi então que, depois de não ter mais nada que inventar, depois de já ter nascido no coração e subido pra cabeça, a música baiana foi descendo, descendo, descendo e parando no lugar de onde ela não quer sair nem a pau: no tcham da mulherada!!!! (tcham, pra quem não se lembra é um substantivo glúteo-passivo de origem betojamaicana que quer dizer bumbum). Aí a sacanagem rolou solta, meu amigo. O que teve de menininha trocando o Ylariê da Xuxa pelo pau que nasce torto do Jacaré não tava escrito!
E quando todo mundo achou que as letras das músicas do carnaval da Bahia eram o fim da picada (sem duplo sentido, por favor) eis que surge, então, o maior exemplo de falta de criatividade somado a um apelo erótico-musical nunca antes visto na história desse país, como costuma dizer nosso presidente e professor de Educação Sexual, Luis Hilário Lula da Silva: ela mesma, a tal da suingueira (ou quebradeira, pagodeira etc), que além de ser a prima feia, pobre e desdentada da axé music anda de caso com o funk e foi vista dando uns amassos no arroxa.
Trata-se daquele solo grudento de cavaquinho que, com apenas dois acordes enjoados, deixa tudo quanto é marmanjo rebolando de um jeito que nem a Gretchem fazia no programa do Chacrinha nos anos 1980. A meninada adora, fazer o que? Tem gente que nem faz idéia mais do que seja MPB, seja lá o que isso signifique hoje em dia. Querem mais é isso mesmo, somente isso: botar a mão no joelho, dar uma raladinha, cair na quebradeira e mexer a bundinha. A garota de Ipanema, coitada - que Vinícius de Moraes me perdoe a blasfêmia - já virou periguete há muito tempo na boca do povão.
Eu imagino que se existisse um manual prático de "quebradeirologia" ou “ arroxologia”, nele estariam algumas instruções básicas para se fazer sucesso com esse tipo de (argh!) música. Por exemplo:
1. A LETRA: Fica estritamente proibido uso de frases longas ou coisas que tenham algum significado real. Ou algum de vocês vai me convencer de que tem sentido algo do tipo: pompom piri, pompom piri. Ou então “venha, venha, venha, venha...” !? Portanto, esqueçam as dores do mundo, deixem o sol bater na janela do quarto do Renato Russo, o Chico Buarque olhando a banda passar ou o Djavan pensando que o dia tá frio e que tá bom pra ler um livro. O dia tá é fervendo, meu amigo, e qualidade aqui é o que menos importa, afinal de contas depois de dois capetas, duas latinhas de cerveja e um red bull na cabeça eu garanto que ninguém vai se importar com toda profundidade poética da composição. Portanto, pode caprichar em refrões de sentido bastante profundo tipo "não me chame não, viu!", "sou putão", "tô indo" ou "vou botar pressão, mamãe", sempre, é claro, repetido no mínimo umas 536 vezes.
2. AS RIMAS: São outro primor de originalidade. A música baiana nos oferece um balaio de palavras que se combinam e se completam. Por exemplo: verão rima com coração, emoção, explosão... Bahia rima com alegria, magia, fantasia. Amor rima com calor; axé rima com fé, boca com louca etc. Julieta não vale porque aí também já é demais.
Eu, talvez tomado por um súbito complexo de coroice precoce, já vendo os quarenta anos acenando ali na frente e os vinte e poucos mofando num velho álbum de fotografia (kodak, alguém se lembra?), continuo insistindo na tese de que o ridículo de antigamente, tanto na música quanto na televisão, ainda era bem melhor do que o grotesco que a gente ouve, e assiste, hoje em dia. Mesmo não me esquecendo que, em 1985, a gente achava o máximo colocar os dois dedinhos pra cima e pra baixo e sacudir o esqueleto ao som do deboxe do Luiz Caldas. Enquanto que as meninas, hoje senhoras preocupadas com suas pequenas princesas, não se cansavam de abrir a roda pra dança da galinha de Sara Jane. Que atire a primeira garrafinha de loló quem nunca fez isso há 20 anos atrás.
Mas isso não é tudo, meu caro, e como dizia Cazuza: o tempo não para. Nossos netos vêm por aí e pode ir se preparando porque o carnaval de 2030 promete bombar!!!
Bombar? Que coisa mais careta, Vô!!

Um comentário:

Unknown disse...

Cara...fico contente em saber que que alguem ai no Brasil pode fazer algo que eu gostria mais nao tenho tempo de fazer: Pensar e Construir Opiniões.

Muito bem Jan. Sorte e Já ganhou um leitor.